domingo, 31 de outubro de 2010



BECHEROVKA






Norueguesa, alta, de um moreno

duvidoso que sorria muito.

Pedia-me insistentemente para não estar

triste como deveras estava.

E pagou-me, creio, o último copo,

antes de me perguntar “o que fazia”.



Escrever, sobre a morte, não é

exactamente uma profissão.

Mas foi a resposta que lhe dei,

enquanto um guardanapo qualquer

abreviava, só para ela, a minha “obra”.



Nunca saberei se percebeu a letra,

se comprou os livros, se chegou

a ouvir o que em péssimo francês

lhe tentei dizer nessa noite, a mais perdida.



Os versos são quase sempre isto: um modo

inaceitável de dizer que não tocámos o corpo

que esteve, por uma vez, tão próximo

de nós – e que nem um nome breve nos deixou.






Por Manuel de Freitas

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