quinta-feira, 28 de julho de 2011



 













NO POÇO




O meu pai cingiu a corda,

um nó em torno da minha cintura,

e baixou-me para o interior

das trevas. Pude provar o sabor




do meu medo. Primeiro do escuro,

depois da terra, depois da podridão.

Oscilei e bati com a cabeça

e nesse instante cheguei




a outro medo: o do sangue,

que me fez cerrar ferreamente a boca.

À força de mãos, o meu pai

fez-me passar por tudo isto:




depois a água. Depois o pêlo encharcado,

que abracei contra o peito.

Gritei. E o meu pai puxou a corda

molhada. Desequilibrei-me, apertei




o cão desaparecido do meu vizinho

contra mim. Segurei a sua morte

e ascendi até ao meu pai.

Depois luz. Depois mãos. Depois a respiração.







Por Andrew Hudgins

Tradução de Lp, Do trapézio, sem rede

3 comentários:

  1. Uma bela saída do fundo do poço, parabéns. Um abraço, Yayá.

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  2. Este poema é uma descrição, um desenho,uma aparição daquilo que nos inventa em nascimentos, como sair do primeiro poço, dos tantos outros...Somente o que não é a mãe, poço sem fim, morte certa, é pai, capaz de fazer com que se experimente viver a escuridão para,enfim, enxergar!beijo grande e ...agradecida pelo poema.
    adriana bandeira

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  3. Fizeste uma leitura muito boa do poema, que pode ter várias, Adriana. Obrigado pela visita. Abraços

    António

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