sábado, 16 de julho de 2011















AUTO-RETRATO NUM AVIÃO

em classe económica







Dobrado como um embrião,

esmagado num assento estreito,

tento recordar

o aroma do feno recém-cortado

quando em Agosto as carroças de madeira

descem dos prados de montanha,

baloiçando pelas estradas de terra

e o condutor grita

como os homens sempre gritam quando entram em pânico

- gritaram dessa forma na Ilíada

e nunca mais se silenciaram desde então,

nem durante as Cruzadas,

nem mais tarde, muito mais tarde, próximo de nós,

quando ninguém os escutou.




Estou cansado, penso naquilo o que

não pode ser pensado - no silêncio que reina

nas florestas quando as aves dormem,

sobre o final próximo do verão.

Mantenho a cabeça entre as mãos

como se a protegesse da aniquilação.

Visto de fora, sem dúvida que

pareço imóvel, quase morto,

resignado, merecendo simpatia.

Mas não é assim - sou livre,

talvez mesmo feliz.

Sim, seguro a pesada cabeça

em minhas mãos,

mas dentro nasce um poema.








Por Adam Zagajewski

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